Por John Blount*
A mineração de criptomoedas consome grande quantidade de energia e isso não é novidade. Tendo como base essa realidade, há quem acredite que esse tipo de atividade não possa ser implantada no Brasil de forma segura enquanto o déficit energético do nosso país não for corrigido. Mas não é bem assim que funciona. Na verdade, a mineração é uma atividade com grande capacidade de incentivar o desengavetamento de projetos nessa área.
Por se tratar de um segmento econômico novo, muita gente não entendeu ainda que a mineração é completamente agnóstica em relação à localização da fonte de energia. Isso significa que a mineração poderia ser usada para tirar do papel centenas de milhares de projetos que têm excelente capacidade de geração, porém a distância das linhas de transmissão impede que sejam construídos.
Existem centenas de PCHs (Pequenas Centrais Elétricas) que têm uma capacidade de geração excelente, mas estão longe dos centros consumidores e exigem uma linha de conexão de dezenas de quilômetros que muitas vezes podem ser mais caras do que as próprias usinas. Como a mineração de criptomoedas acontece na fonte de geração, ela torna viável a construção da PCH, pois garante que haverá consumo da energia produzida desde o primeiro minuto de geração. Assim, a conexão da eletricidade ali gerada com o grid nacional pode se tornar viável de imediato ou, no pior cenário, ser feita futuramente de forma mais planejada e com o custo diluído ao longo do tempo.
Sendo a mineração agnóstica no que diz respeito à localização, ela também o é com relação ao tipo de fonte utilizada. A produção de energia elétrica pode ser hídrica ou eólica. O importante é não existir grande intermitência, como é o caso da energia solar, que não é gerada à noite. Para esse caso, teria de ser feito um sistema de baterias ou mesmo um net metering, consumindo os créditos gerados de dia ou, ainda, um microgrid com diversos tipos de matrizes no mesmo local. Infelizmente, este último sistema esbarra em custo, impostos e outros problemas característicos do nosso país. Considerando a aptidão do Brasil para energias renováveis, a mineração certamente será grande impulsionadora de projetos que antes estavam fora de cogitação, auxiliando a criação de infraestrutura menos dependente das linhas de financiamento comuns.
Outro impacto positivo da mineração no mercado brasileiro será sobre a qualidade da mão de obra necessária para a atividade. Assim como qualquer outra indústria que trabalha com computadores, máquinas, circuitos impressos, entre outros, a mineração demanda profissionais especializados. Estamos falando de perícias conectadas com as áreas de eletricidade, computação, manutenção, geração etc. Em todas existe falta de mão de obra no Brasil e certamente haverá a necessidade de criação de cursos e escolas para formação desses novos profissionais. Em conjunto com os profissionais também devemos ver a criação de centros especializados em manutenção e futuramente até fábricas de ASICs aqui no país. Para quem não está acostumado com essas siglas, ASICs são equipamentos de computador baseados em circuitos ou chips integrados e desenvolvidos para executar funções muito específicas, como no caso da mineração.
Mas, para que estes impactos positivos aconteçam, é importante a criação de regras claras sobre o setor de mineração no país. O primeiro passo foi dado com a Gecex retirando o imposto de importação sobre as máquinas de mineração. Geração de emprego e renda acontecem quando as regras são claras e a indústria pode crescer sabendo qual é seu papel. Estamos falando de investimentos de longo prazo, como em infraestrutura e eletricidade, que puxam vários setores e geram uma quantidade bastante grande de empregos indiretos e diretos.
Internacionalmente a China foi uma grande mineradora e recentemente uma empresa anunciou investimentos nessa área na Argentina. Não tenho dúvidas de que a mineração pode trazer ganhos econômicos imensos para o Brasil. Mais do que isso, é um ramo crucial caso nosso país realmente queira se colocar em posição de vanguarda na economia global.
Ter parte do hashrate (poder de computação da rede do bitcoin) pode ser uma forma de demonstrar força econômica. Isso porque são milhares de dólares utilizados para criação de infraestrutura e uma cadeia de empregos que vai se alongando pelos setores envolvidos, da construção civil às fábricas de componentes elétricos. Como qualquer indústria nascente, os desafios iniciais serão enormes, mas, uma vez que as cadeias de suprimentos estejam desenvolvidas, devemos ver um impacto bastante positivo nos setores envolvidos.
Potencial o Brasil tem. Fomentar o mercado de mineração de criptomoedas é uma chance excelente para aumentar nossa capacidade de geração sem a total dependência do financiamento público para as obras. Só necessitamos que todos, políticos e empresários, acordem para essa grande oportunidade o quanto antes.
*John Blount é CEO da FMI Minecraft Managament – fmi@nbpress.com