*Por Janaína Rosas e Ludmila Santos, da agência Triunfo Sudler
A autonomia feminina passa por conhecimento de si e adesão a soluções que garantam qualidade de vida, maior domínio sobre o corpo e seus ciclos, possibilitando uma melhor conciliação com as demandas cotidianas da mulher atual.
Ainda que o tema da autonomia feminina seja recente e fruto de uma série de debates, discussões e mudanças de atuação no cenário social, é notável que mulheres ocupam, cada vez mais, lugares de destaque para além da esfera doméstica/familiar. Elas estão no mercado de trabalho, na política, nas artes, na mídia, nas universidades e centros de pesquisa. Isso implica em entender como seus corpos, com suas individualidades e particularidades, seus processos biológicos, sua psique e suas novas necessidades, são pensados coletivamente e, com isso em mente, como suas demandas são entendidas, abordadas e atendidas.
Da cantora, passando pela menina que se depara com a menarca, até a mulher madura constantemente convocada a não envelhecer, o corpo feminino, tudo que ele representa e que o compõe, é constantemente fruto de tabus sociais, com consequências físicas e psíquicas para a vida das mulheres. Temas como gravidez, menstruação e menopausa sempre expõem como o universo feminino é cercado de interdições reais e simbólicas, não só na nossa sociedade como nas mais distintas culturas.
Em algumas sociedades indígenas, por exemplo, o sangue menstrual é considerado impuro ou, ainda, o período da menstruação pode ser visto como um momento de vulnerabilidade feminina, fazendo-as passar por rituais de isolamento e purificação. Na nossa cultura, a menstruação, e consequentemente tudo a ela associado, também carrega seus tabus, mitos e interdições.
Isso se aplica, por exemplo, ao pouco conhecimento acerca da endometriose, tema destacado neste artigo, e sua constante associação e redução a dores menstruais ou a outras doenças do trato urinário ou ginecológico. Apesar de sua relevante incidência (estima-se que ocorra em 6 a 10% das mulheres, e, destas, de 30 a 50% apresentam problemas de infertilidade), ainda há pouco conhecimento e divulgação acerca da doença. Constantemente, tratam-se os sintomas, mas o aprofundamento sobre a doença, sua manifestação e o impacto na vida das mulheres por ela afetada ainda deixa a desejar.
A endometriose é uma condição que ocorre quando o endométrio, tecido que reveste a cavidade uterina, em vez de ser naturalmente expulso durante a menstruação, se movimenta em direção oposta, rumo aos ovários e à cavidade abdominal, causando desconforto e dor. Entre os possíveis sintomas físicos é possível citar: cólicas menstruais, dor nas relações sexuais, dor e sangramento ao evacuar, fadiga, diarreia e dificuldade para engravidar/infertilidade.
A dificuldade de diagnóstico pode se dar pela falta de compreensão, tanto médica como por parte do público leigo, acerca da doença e sua complexidade, como também em função dos sintomas coincidentes com outras condições médicas.
As ferramentas para o diagnóstico e tratamento englobam a anamnese, capaz de levantar fatores como hereditariedade e impactos psicológicos, o exame ginecológico, exames de imagem e o desdobramento para opções terapêuticas diversas, a cirurgia e as tecnologias de reprodução assistida (ART) voltadas às pacientes com infertilidade causada pela endometriose.
A relevância médica, social e econômica da endometriose coloca-a como um problema de saúde pública demandando ações, campanhas educativas e de conscientização a respeito da doença, sua incidência e impactos. Sua associação a quadros de depressão e fadiga implica em efeitos psíquicos e físicos para as mulheres, e também causa ônus econômico e financeiro, já que influencia a produtividade feminina no mercado de trabalho.
Por isso, o foco voltado às necessidades do corpo feminino ultrapassa a questão do bem-estar individual e volta-se ao equilíbrio social, trazendo à tona questões como equidade e igualdade. O conhecimento sobre a endometriose é uma faceta desta transformação, que engloba e coloca em foco a mulher como ser cultural, psíquico e coletivo, entendendo sua importância individual e global.