Por Bruna Degani, Gerente Jurídica na Ahgora*
A pandemia aumentou tanto o número de empregados atuando no regime de trabalho remoto que uma atualização na legislação trabalhista se tornou inevitável. No dia 25 de março deste ano foi aprovada a medida provisória (MP) 1.108/22, que trata sobre o pagamento do auxílio alimentação e regulamenta o teletrabalho.
O trabalho remoto foi uma solução para as restrições de mobilidade impostas pela pandemia. Mas a estratégia que tinha caráter temporário se tornou definitiva para várias empresas. O problema, então, passou a ser como controlar a jornada de trabalho, tanto a favor do empregador, principalmente para permitir o gerenciamento das atividades quanto do empregado, além de questões jurídicas que poderiam resultar em processos trabalhistas, o que não é desejável. O intuito da MP em questão é nortear a execução do trabalho de forma remota.
O artigo 6º da MP 1.108 destaca que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sofreu alterações nos seus artigos 62, 75-B, 75-C e 75-F. Isso foi necessário para permitir que as empresas adotem o modelo híbrido, reforçando que não se trata de trabalho externo como, por exemplo, exercido por representantes de vendas, contatos publicitários ou instaladores de TV a cabo. Vale ressaltar que a CLT foi criada em 1943 quando nem computador existia. E mesmo com as atualizações que sofreu ao longo dos anos, necessário se fez modificar os pontos citados.
Foi estabelecido que o empregado submetido ao regime de teletrabalho ou trabalho remoto poderá prestar serviços por jornada ou por produção ou tarefa. Na hipótese do contrato prever o trabalho por produção ou tarefa não se aplicam as regras da duração de trabalho, inclusive de controle de jornada definida a partir do artigo 57 até o artigo 75-F da legislação trabalhista.
No entanto, quando o empregado for contratado para prestar serviços por jornada as empresas deverão ter esse controle, já que terão a obrigação de pagar horas extras, caso seja ultrapassado o número de horas regulares. Para tanto, será necessário a adoção de sistemas de controle de ponto on-line. Eles permitem ao empregador e ao empregado acompanhar toda a jornada e possibilitam que as regras sejam iguais às aplicadas no modelo de trabalho presencial.
Cabe destacar que o colaborador poderá comparecer presencialmente na empresa para execução de atividades específicas, ainda que de forma habitual. A mudança feita no parágrafo 1º do artigo 75-B da CLT deixa claro que isso não descaracterizará o trabalho remoto. Já o parágrafo 4º do mesmo artigo diz que esse regime não se confunde e nem se equipara à ocupação de telemarketing ou de teleatendente.
As empresas estão autorizadas a replicar esse regime a todos os colaboradores, inclusive estagiários e aprendizes, mas deverão conferir prioridade àqueles com deficiência e que tenham filhos ou crianças sob guarda judicial até quatro anos de idade. Independentemente de onde resida o colaborador contratado no regime de teletrabalho serão aplicadas as disposições previstas na legislação local e nas convenções e nos acordos coletivos de trabalho relativos à base territorial da empresa contratante. E caso o contrato seja celebrado em território brasileiro, mas o funcionário resolva cumpri-lo em outro país, prevalecerão as regras da legislação brasileira, salvo se as partes estipularem algo em contrário.
Por fim, é muito importante que as empresas especifiquem expressamente no contrato de trabalho desses colaboradores que eles foram alocados para a modalidade de trabalho remoto. Inclusive para informar quem ficará responsável pelas despesas resultantes do retorno ao trabalho. Em conjunto, devem celebrar acordos individuais com esses colaboradores para deixar claro os meios de comunicação e qual jornada de trabalho deverá ser cumprida de forma a assegurar os repousos exigidos pela legislação.
O que se espera é que essas mudanças tragam maior segurança jurídica aos empregadores e empregados, uma vez que o modelo de trabalho remoto nas condições em que estava sendo exercido deixava muitas dúvidas. Mesmo que ainda existam questões a serem discutidas, as regras ficaram mais claras, e basta a implantação e o uso correto das ferramentas digitais de controle para que as relações trabalhistas sigam tranquilas nessa nova sociedade que estamos criando.
Bruna Degani é Gerente Jurídica da HR Tech Ahgora, desenvolvedora de tecnologias inovadoras para recursos humanos, com o objetivo de empoderar e tornar mais estratégicos os profissionais da área. – ahgora@nbpress.com
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