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Embora a simplificação do sistema tributário tenha potencial para reduzir custos, forma como a reforma será implementada pode resultar em aumento para determinados produtos, avalia tributarista
Com o início do ano letivo, uma das maiores preocupações das famílias é a compra de material escolar. Além do impacto financeiro que esse gasto causa no orçamento doméstico, um fator crucial que tem pressionado os preços, é a alta da carga tributária. Dados de uma pesquisa realizada pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) apontam que os tributos que incidem sobre alguns produtos escolares podem chegar até 52% do preço final de cada item. Isso reflete na complexidade do sistema tributário atual, que pode sofrer consequências com a implementação da reforma tributária.
Embora as mudanças tenham o objetivo de simplificar e modernizar a tributação, a partir da criação do Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS), o efeito sobre o preço dos materiais escolares pode ser complexo. Afinal, a unificação de impostos pode reduzir a burocracia e os custos indiretos para as empresas, mas, por outro lado, pode gerar aumento em algumas alíquotas ou redistribuir a carga tributária de maneira desigual. É o que acontece com a Emenda Complementar n. 132/23 que, ao estabelecer um regime especial apenas para os serviços de educação, deixa de contemplar bens e serviços essenciais para essa área, como os materiais escolares.
“A Emenda Constitucional n. 132/2023 previu que os novos tributos sobre o consumo (o IBS e a CBS) terão alíquota reduzida em 60% para os serviços de educação. Todavia, os bens destinados à educação não foram contemplados. Como um dos objetivos da reforma era equiparar bens e serviços para que não houvesse mais a discussão do que é uma coisa ou outra, é de se estranhar e criticar a diferenciação feita nesse caso, a qual acabou excluindo insumos inerentes às atividades educacionais”, explica Rafael Pandolfo, advogado tributarista e sócio-fundador do escritório Rafael Pandolfo Advogados Associados.
Entendendo a importância da educação como um direito básico, a Constituição Federal prevê a imunidade tributária de livros, jornais e periódicos. Essa medida reflete a compreensão de que o acesso ao conhecimento e à cultura deve ser facilitado, e a tributação sobre eles poderia restringir esse acesso. Assim como os livros, os materiais escolares também são essenciais para o processo educativo. E, embora a Constituição não trate especificamente do material escolar, surge a reflexão sobre a possibilidade de incluir itens como cadernos, canetas, lápis e mochilas nesse contexto.
“A imunidade tributária para materiais escolares tal qual pretende a PEC 24/2014 seria uma medida extremamente benéfica para a sociedade brasileira. A desoneração ajudaria principalmente as famílias de baixa renda. Mesmo que tenha uma abrangência mais ampla, a redução do custo de instrumentos essenciais à educação e à produção do conhecimento é benéfica para qualquer país em desenvolvimento”, avalia o tributarista.
Dentro do contexto da reforma tributária, o conceito de “cashback” aparece como um importante instrumento, segundo o especialista, ainda que tenha um alcance restrito. “Um mecanismo promissor no universo da tributação é o cashback previsto na Emenda Constitucional n. 132/2023. Segundo o PLP 68, de 2024, os materiais escolares entrarão na regra geral, que prevê a devolução de 20% do valor pago a título de IBS e CBS. Esse benefício, no entanto, contempla famílias com renda de até meio salário mínimo por membro — o que corresponde a R$ 706 atualmente. Seu alcance, portanto, é muito restrito”, finaliza.
Sobre Rafael Pandolfo Advogados Associados:
Rafael Pandolfo Advogados Associados é um escritório de advocacia com foco em direito tributário. Com mais de 20 anos no mercado, o escritório tem como ponto central realizar trabalhos profundos, com ponderação estratégica e técnica, além de fomentar uma advocacia contundente, clara, com linguagem assertiva e acessível para todos. Rafael Pandolfo é sócio-fundador do escritório, formado em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Mestre e Doutor em Direito Tributário pela PUC-SP, e é integrante da categoria “Star Individuals” do guia Chambers Top Ranked Brazil 2024. Além disso, Pandolfo é o coordenador técnico do programa Resgate-RS, que busca implementar medidas tributárias necessárias à recuperação de empresas atingidas pelas enchentes de maio de 2024 no Rio Grande do Sul.