POR: Assessoria de Imprensa Instituto Presbiteriano Mackenzie
Márcio Coimbra
Em 2020 a pandemia mexeu com as estruturas do mundo como conhecemos. As mudanças foram profundas e de toda ordem, pautando de forma importante a geopolítica mundial, afinal, um vírus letal causou impactos profundos nos mais diferentes pontos do planeta. Adiante, a pandemia continuará sendo um ator crucial nos jogos de poder, que aliada a outros fatores devem definir os rumos do mundo em 2021.
A vacina é o ponto de partida do ano que se inicia. Um esforço que começou pelo Reino Unido, já travessou o Atlântico para os Estados Unidos e já se espalha pelo mundo. O impacto do caminho da vacinação afetará o grau de reabertura das economias, sendo crucial para que muitos países consigam retomar o emprego, produção e estabilidade abalados durante a pandemia.
Certamente países periféricos enfrentarão problemas maiores, com pouco acesso a recursos ou a logística necessária para uma ampla vacinação. O Brasil, diante de seu vasto território, certamente enfrentará enorme desafio em fazer com que a vacina chegue a todos os municípios em pouco tempo. Aliás, tempo é elemento essencial a partir deste momento, uma vez que a retomada da economia depende da rapidez e segurança do processo de imunização.
A pandemia será o tema central do governo que chega na Casa Branca. Joe Biden precisará lidar nos dois primeiros anos de mandato com duas questões centrais: imunização e retomada. Com o maior número de vítimas da covid-19, o trabalho dos americanos será focado na imunização e na recuperação dos empregos e da atividade econômica, um processo que deve durar no mínimo estes dois anos, quando o país encara um novo processo eleitoral com a renovação da Câmara e de 1/3 do Senado.
O peso geopolítico dos americanos será um ponto importante a ser observado, uma vez que a beligerância de Trump será substituída pelo tom diplomático de Biden. O novo presidente é velho conhecido do establishment de Washington, com amplo trânsito entre os dois partidos e uma vasta experiência em relações exteriores, seja no Senado, como na Vice-Presidência. Veremos uma mudança profunda de narrativa e exercício do poder, abrindo-se espaço para multilateralismo, diálogo e soft power.
Neste novo desenho, a Rússia assume o papel de maior antagonista de Washington, com Pequim sendo monitorada, contudo sem o enfrentamento exposto e direto exercido por Trump. A influência destes dois atores na América Latina, território de natural influência americana, é um dos pontos que a Casa Branca deve manter em seu radar. A influência de chineses e russos no continente americano é vista com muita desconfiança por Washington e certamente Biden irá trabalhar para evitar a expansão deste movimento.
A Rússia deve lidar com os desafios de manter as antigas repúblicas soviéticas sob o seu domínio, mesmo que indireto. As reações contra a influência de Moscou foram a tônica em diversos países em 2020 e o Kremlin deseja evitar que estes questionamentos se ampliem para países vizinhos. A crise em Belarus, que vivenciou uma fraude eleitoral de proporções inimagináveis, precisa ser contida. Lukashenko, o autocrata patrocinado por Putin, pretende se manter no poder. As perseguições e prisões políticas fazem parte do cardápio na região, mas a resistência da União Europeia tem ajudado a evitar o pior.
Ainda em 2020, a Rússia teve que lidar com a crise entre Armênia e Azerbaijão, um novo governo anti-Kremlin eleito na Moldávia e uma severa crise política no Quirguistão, na fronteira chinesa. Putin buscará estabilizar os satélites ou terá que lidar com uma onda de governos hostis em países que Moscou considera ter influência direta.
Enquanto isso, a China, que acredita possuir uma província rebelde em Taiwan, decidiu usar todo seu poder para cercear Hong Kong. O receio internacional é que use esta experiência e momento para avançar sobre Taipei, colocando a região em estado de alerta. A comunidade ocidental internacional se mobiliza para defender Taiwan de qualquer avanço chinês sobre seu território autônomo.
Pequim possui outras frentes de batalha. A principal é uma ofensiva de reconstrução de sua imagem, dilacerada após a disseminação da covid-19. O controle inicial da doença foi falho. Uma administração caótica do problema ampliou o alcance do surto, transformando a doença em uma pandemia com reflexos mundiais. Uma intervenção inicial e combinada teria sido crucial para evitar a propagação viral. Um fato que marcará para sempre a imagem de Wuhan.
A reconstrução da imagem chinesa, entretanto, precisa ir muito além disso. A perseguição aos uigures ganhou espaço na mídia e precisa cessar. Se Pequim deseja reconstruir sua imagem depois da covid-19, deveria respeitar os Direitos Humanos da minoria uigur, cessar a pressão sobre Taiwan e as ameaças diplomáticas aos países que não desejam adotar seu padrão de 5G da Huawei. Hoje já são mais de 50 nações.
Neste espectro surge o Brasil, que deve definir o caminho que irá seguir no tocante ao 5G, com grandes chances de afastar-se da solução chinesa, mesmo sofrendo risco de retaliação, como aconteceu com a Austrália recentemente. Este, entretanto, é apenas um dos desafios que o Brasil deve enfrentar. Com uma região que se movimentou para esquerda no espectro político com vitórias na Bolívia e Argentina, o Brasil adquire importância seminal na região liderando um caminho à direita que pode seguir pressionando a ditadura de Maduro na Venezuela.
A pandemia é certamente o maior desafio do mundo no ano que começa, contudo, questões relevantes seguem no radar, como as violações aos Direitos Humanos em lugares como Coréia do Norte, China, Rússia e, também, Venezuela. O Brexit segue sendo um desafio na Europa, ao mesmo tempo que o Brasil espera ver encaminhado o acordo entre Mercosul e União Europeia. A liberdade de expressão sofre ataques em Hong Kong, Turquia e China e a soberania de Taiwan é colocada em xeque por Pequim.
O xadrez político internacional recebe novos atores na medida que se reposiciona esperando os movimentos deste intrincado jogo. Desta soma de fatores deve surgir um novo equilíbrio de forças, com esgotamento de soluções populistas e renascimento de um mundo multipolar. 2021 promete. Até porque, convenhamos, 2020 realmente ficou devendo.
Márcio Coimbra é coordenador da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil. Diretor-Executivo do Interlegis no Senado Federal.
Sobre a Faculdade Presbiteriana Mackenzie
A Faculdade Presbiteriana Mackenzie é uma instituição de ensino confessional presbiteriana, filantrópica e de perfil comunitário, que se dedica às ciências divinas, humanas e de saúde. A instituição é comprometida com a formação de profissionais competentes e com a produção, disseminação e aplicação do conhecimento, inserida na sociedade para atender suas necessidades e anseios, e de acordo com princípios cristãos. O Instituto Presbiteriano Mackenzie (IPM) é a entidade mantenedora e responsável pela gestão administrativa dos campi em três cidades do País: Brasília (DF), Curitiba (PR) e Rio de Janeiro (RJ). As Presbiterianas Mackenzie têm missão educadora, de cultura empreendedora e inovadora. Entre seus diferenciais estão os cursos de Medicina (Curitiba); Administração, Ciências Econômicas, Contábeis, Direito (Brasília e Rio); e Engenharia Civil (Brasília). Em 2021, serão comemorados os 150 anos da instituição no Brasil. Ao longo deste período, a instituição manteve-se fiel aos valores confessionais vinculados à sua origem na Igreja Presbiteriana do Brasil.