*Por Samanta Lopes
A pandemia aumentou o número de vaquinhas, ou seja, grupos que ajudam uma pessoa ou causa através de diversos portais de financiamento coletivo. Muitas pessoas conseguiram sobreviver, inclusive na área artística, graças a essas iniciativas.
Uma característica do mercado no Brasil é que, quando aumenta a procura, os valores aumentam, mesmo com fins sociais como os das vaquinhas. Assim, as pessoas gestoras dessas iniciativas aumentaram as taxas, e alguns até disponibilizam cursos para melhorar as arrecadações.
Um site que andou um pouco na contramão dos demais foi o Razões para Acreditar. Continuaram propagando notícias e pedindo ajuda para as pessoas e entidades que precisavam, sem tornar o processo abusivo.
Quando trago esse tema, quero lembrar que mais uma vez falamos de situações de privilégio e de real capacidade de mudar uma vida ou várias. As vaquinhas estarão mais presentes neste fim de ano, afinal muitas pessoas não conseguiram voltar ao trabalho ou ficaram com sequelas da pandemia.
Há muitas histórias sofridas em andamento, e certamente é mais fácil doar por um serviço como esse do que se voluntariar, por exemplo, para ser uma pessoa presente, que visite alguém em entidades como a Casa Florescer ou a Casa 1, que abrigam pessoas da comunidade LGBTQIA+ – um dos grupos que mais sofre com violência seguida de morte em nosso país. O dossiê “Assassinatos e Violência contra Travestis e Transexuais Brasileiras em 2020” nos coloca no 1º lugar entre os países que mais assassinam pessoas trans no mundo – v. Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
Não há demérito em arrecadar recursos e fazê-los chegarem a quem precisa. A questão é: o que isso muda em sua vida e na das pessoas que apoiou? Quando falamos das vaquinhas, elas realmente chegam a muitas pessoas e ficamos sabendo de suas histórias e nos sensibilizamos. Mas será que continuar doando resolve?
Como o querido Joseph Kuga, homem trans e especialista em diversidade, disse há alguns dias em um bate-papo: “Visite o lugar, conheça as pessoas, pergunte como pode ajudá-las a terem uma vida melhor, e escute. Ajude a construir um currículo, encaminhe para pessoas conhecidas e leve para sua empresa, abra espaço para a contratação, considerando treinamento, preparo do local e sensibilização da equipe. Planeje, pergunte a quem está ajudando, o que a pessoa precisa e como pode ser ajudada. Isso começa por respeitar o nome pelo qual ela quer ser apresentada quando iniciar”.
Muitas pessoas promovem amigos secretos, amigos da onça, enfim, geram interações entre as pessoas colaboradoras em festas que custam caro. Por que não pensar em usar esses momentos para promover a entrega de bolsas com absorventes, itens de higiene pessoal, um livro, ou até algum outro mimo para mulheres do sistema prisional ou para entidades que apoiam moradores de rua, como o projeto Lavanderia, do Lucas Caldeira (@ninhosocial)?
E não é mandar entregar. É ir ao local, olhar as pessoas nos olhos, fazer um bolo e um café para compartilhar, enquanto ouve delas sobre os seus sonhos para o ano novo.
As vaquinhas vão continuar e espero que se ajustem para serem mais inclusivas, garantindo, sim, que sejam sustentáveis para atender a mais pessoas que precisam delas. Por outro lado, será ótimo o dia em que não precisarmos mais delas, pois será um sinal de que conseguimos encontrar o equilíbrio e todas as pessoas vivem vidas dignas, com perspectivas de um futuro melhor.
*Samanta Lopes é coordenadora MDI da um.a #DiversidadeCriativa, agência de live marketing – uma@nbpress.com
Sobre a um.a
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