Uma breve análise histórica e o potencial ajuste jurídico à ineficiência de mercados
Por Thomas Magalhães
O ar é de jargão, mas não se pode negar que estamos passando por um momento único na história da humanidade. A Pandemia da Covid-19, é a maior crise, desde a Segunda Guerra Mundial, e afeta nossa saúde, vida social e econômica de uma maneira nunca presenciada pela sociedade.
Existem diversos aspectos humanos que ainda vamos enfrentar ao longo da Crise Covid-19 e seus consequentes reflexos.
De imediato, já são visíveis impactos econômicos que terão como consequência futuras implicações jurídicas a serem desenvolvidas. Com isso, podemos inclusive verificar soluções positivas para o desenvolvimento de nossa sociedade.
Mas vou iniciar analisando grandes crises pelas quais passamos, seus efeitos e os remédios que elas nos propuseram. Como a Crise de 1929, ou o Crash de Wall Street; a Bolha da Internet dos anos 2000; e ainda a Crise do subprime de 2008.
Apesar dessas crises serem de amplo conhecimento e impacto histórico, em todos os casos, apesar das datas que mais lembramos, demorou em média de 01 a 02 anos para que o mercado de ações atingisse a sua mínima, ou seja, o bottom line de negociação das ações após os impactos desastrosos que assustaram a sociedade.
A Crise de 1929 até hoje é lembrada como a quinta-feira negra, já a Crise da Bolha da Internet aconteceu a divulgação dos dados econômicos negativos americanos nos anos 2000; e a Crise do Subprime a falência do Lehman Brothers em 2008.
Ainda, em cada uma das crises acima, a sociedade as enfrentou e criou alicerces jurídicos para que, em momentos futuros, o estado e a sociedade tivessem remédios que pudessem evitar ou mitigar impactos de crises semelhantes.
Decorrente da Crise de 20, podemos verificar o Glass-Steagal Act que criou as bases de um sistema financeiro moderno (criação do Federal Reserve, segregação das atividades bancárias, dentre outros); na Bolha da Internet, como um dos fatores, tivemos a publicação do conjunto de medidas legislativas americanas entendidas como Legislação Sarbanes-Oxley, onde foram criadas métricas para auditoria unificada; enquanto na Crise Subprime, foi implementada a Legislação Dodd-Frank, a qual vem tentando executar uma melhor supervisão bancária (apesar das grandes “armas de destruição em massa” que ocasionaram essa crise ainda padecerem de regulação, os derivativos).
Mas voltemos a falar sobre a Crise Covid-19.
Às vésperas da eclosão nacional da Crise Covid-19, o Brasil vivia um momento de ingresso de novos investidores na bolsa de valores em razão da perspectiva de alta de mercado e em contrapartida das taxas de juros brasileiras se aproximarem da realidade mundial.
Em questão de semanas o mercado de ações atingiu sua mínima surpreendendo a todos, inclusive os investidores inexperientes e novatos no mercado de ações. Assim, diferentemente das crises acima exploradas e analisando o indicador do mercado de ações atual, a Crise Covid-19 é realmente abrupta.
O Bear Market não perdoa e esse “Bear” veio com uma força e agilidade de um touro. Para aqueles que não sabem do conceito de Bear Market (Mercado de Baixa – Urso) e Bull Market (Mercado de Alta – Touro), o Bull Market é o mercado touro, da alta das ações, um mercado ágil e com relação a posição de ataque do touro que é como uma “cabeçada de baixo para cima”. Enquanto o Bear Market é um mercado “baixista”, o mercado do urso, um mercado moroso e com uma força brutal, sendo o ataque do urso uma “patada que vem de cima para baixo”.
Enfim, sentimos os primeiros impactos no mercado de ações e agora vemos efeitos relevantes na economia real e os remédios que a sociedade irá desenvolver para sobrevivermos a essa Pandemia que impactou o globo.
Nos atemos a realidade econômica brasileira e potenciais remédios jurídicos que possamos construir. Com a velocidade que essa crise impactou a nossa economia, cresceu a insegurança jurídica em razão dessa nova situação vivida por todos. Havendo a necessidade da imposição feita por nossas entidades governamentais, sobre o afastamento social e a necessidade de algumas atividades de parar seu funcionamento para que não haja aglomerações de pessoas, o relacionamento privado foi abalado e com isso diversas relações de direito.
A primeira grande questão que deve ser levantada é a do caso fortuito ou de força maior e do impacto que estes causam nas hipóteses de inadimplemento contratual.
Em 20 de março, o Congresso acatou a decretação da calamidade pública, data esta vista como fundamental para a nova diretriz do relacionamento legal entre as partes face a pandemia. Deste decreto, diversos projeto de lei estão em discussão para regular este período que vivemos e com isso mitigar impactos que as pessoas têm vivido (ex. Projeto de Lei n° 1179, de 2020 que dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia do Coronavírus).
Ainda, debates que por muito tempo estavam parados por falta de interesse político social voltaram a ser discutidos com força total. Como a legalidade de assembleias empresariais virtuais, regularidade do voto à distância, facilidade na constituição de “startups”, flexibilização da legislação de recuperação judicial, flexibilização da legislação trabalhista, dentro outros.
Não podemos esquecer das medidas infralegais que têm dado agilidade para que a segurança jurídica do estado democrático de direito, como recomendações do Conselho Nacional de Justiça, para a suspensão dos prazos judiciais e o deferimento destas recomendações pelos respectivos tribunais. Assim como determinações do Banco Central do Brasil e da Comissão de Valores Mobiliários quanto a maior eficiência de seus mercados regulados.
Méritos ainda devem ser discutidos no futuro quanto a relevância do sistema único de saúde no Brasil e como a centralização de dados de pacientes é um agente fundamental no combate a uma pandemia, além da discussão de um embrião de renda universal que pode vir a surgir deste “bolsa-Covid-19” que o governo federal implementou a população.
Enfim, estamos voando em meio a uma tempestade, tentando tocar o trem de pouso do nosso avião à uma pista coberta de gelo que não havia programação de aterrissagem. O direito é a construção social de uma sociedade durante um determinado período temporal e hoje os tempos são de ajustes rápidos e o direito deverá acompanhar as necessidades dessa sociedade.
Renata Motta
Jornalista – Assessora de Imprensa